Havia naquele dia um encargo especial nas mãos. A confusão que se ia gerando agitava aquela sensação que todos tínhamos quando nos diziam “Vamos partir”.
Com um ritmo mecânico, quase acompassado, o peito abria e fechava, nem mais nem menos do que aquela distância. Perdurava em nós saudade, marcava-se o desassossego nos rostos que iam preenchendo aquela manhã.
Quando o comboio partiu (para bem longe, sabíamos nós), as nossas mãos encheram-se de todo o nada que ali havia para as preencher.
O medo da distância estampava-se no rosto daqueles que, na sua inocência, se limitavam a ter medo do medo que poderiam vir a sentir. Na minha cabeça, ia-se desenhando a frase: “Quando a espera não tem fim, há distâncias sem perdão”.
Mais tarde entendi que a partida para a saudade era, todos os dias, não muito mais do que aquela serenidade do real: o único leme da liberdade que eu poderia ter. Aprendi que as pessoas não dizem o que sentem, ou não sentem o que dizem. Isto tudo porque, na verdade, a distância que ia do inspirar ao expirar do meu peito foi-se alargando com o tempo e tornou-se solta, leve.
Com o passar dos dias, a saudade foi-se embora. Apagaram-se as lágrimas, soltaram-se os risos, apertaram-se os gestos entre os inocentes. Eu, sem movimento e em silêncio, tentava que o elástico do meu peito não se alargasse. Uma espécie de vontade sem forma. Afinal, isso era negar quem sentia a minha falta para lá daquele silêncio.
Querendo ser livre, ia-se desvanecendo aquela presença, o ser que tudo o que tinha era o Amor, e a sombra da Liberdade, que nunca chegava a ter.
Ainda hoje o meu elástico tem o mesmo tamanho. Ainda hoje eu vivo da presença dele e da segurança que ele me faz alcançar.
Depois daquela viagem aprendi que ia ser livre, quando fosse capaz de dizer todos os dias “Gosto de ti”, com a mesma certeza com que o diria hoje.
Sem comentários:
Enviar um comentário